Tijolo: erigindo um movimento, construindo um futuro.

Por Francisco Cornejo de Souza

A máxima “brothers gonna work it out” aparece em momentos formativos da nossa cultura festiva, sempre encontrando força renovada para sua mensagem de união através de gêneros e eras musicais. Mais tema que lema, mais promessa que proposta, mais convite para a mudança que convocação para a luta, essa poderosa frase apareceu pela primeira vez como refrão de um hino da Soul Music dos setenta de autoria de Willie Hutch, incensado compositor da Motown que a cravou no ritmo de um potente proto-Disco. Já a segunda aparição celebre se dá no final dos oitenta, nomeando um dos vários singles que formam o contundente terceiro álbum do aguerrido grupo de Hip Hop Public Enemy, “Fear Of A Black Planet”. Logo na década seguinte, ela foi evocada por um dos fundadores do Techno de Detroit no pulsante groove houseiro de uma de suas primeiras faixas produzidas do outro lado do Atlântico em colaboração com o Basic Channel. Por fim, temos seu retorno triunfal no começo deste século, intitulando uma seleta acachapante da dupla Chemical Brothers, que se tornou uma das compilações mixadas definitivas do período.

O que perpassa todas essas reiterações é a persistência da ideia que a anima: a de que o trabalho coletivo ao redor de um objetivo compartilhado pode ser transformador. E ela sequer precisa ser proferida para que lembremos de seu poder, ele se manifesta em projetos essenciais para qualquer cena como o materializado pelos esforços do selo brooklyniano-paulistano Tijolo Records no decorrer dos últimos anos. Idealizado por um veterano do corre das musicalidades que se nutrem da realidade caótica das ruas de grandes centros urbanos, ele se firmou como um refúgio inspiracional para uma nova cepa de artistas ávidos por compartilharem suas produções com o mundo. Algo que fortuitamente ocorreu num dos momentos mais dramáticos dos últimos tempos e acabou por prover não apenas uma plataforma para lançamentos, mas um espaço vital para a sobrevivência artística de um grupo de novos talentos em meio a uma pandemia que cerceou drasticamente as possibilidades expressivas existentes para eles.

E foi no espaço destes três anos que ela se firmou como uma frente criativa singular numa região do espectro musical onde inúmeras influências colidem para gerar uma cornucópia de formatos rítmicos de pronto emprego em qualquer pista, especialmente aquelas desprovidas de frescura onde a energia flui pura. O caráter colaborativo dos processos e a pegada independente dos projetos são parte central da identidade deste selo cujo time de talentos conta gente de extração bastante diversificada, dando a contrapartida demográfica ao ecletismo estilístico que também é um elemento conceitual distintivo da empreitada como um todo. Congregando até o momento produtores de São Paulo, Belo Horizonte, Londrina e até Monterrey no México e recobrindo uma ampla gama de gêneros que vai do Techno mais swingado ao UK Garage mais malandro, passando pelo Funk, Electro, Grime e tudo que couber no meio. A operação também inclui eventos, muitos deles com convidados gringos, mas a forca principal reside na solidez da equipe de residentes, uma que inclui uma elite de DJs valentes na selecao e brilhantes na execucacao de seus sets, provenientes de diversas partes do pais. 

Contudo, o mais essencial no funcionamento da Tijolo como empreendimento não é somente quem é ou de onde vem, mas sim como todos contribuem para o seu êxito. Cada um traz um talento e colabora de alguma forma em todas as frentes de atuação que perfazem a presença da marca, desde o design dos materiais promocionais e fonográficos até os serviços de masterização e mixagem dos lançamentos. Um esquema co-criativo e cooperativo que resulta nessa coesão de elementos e pessoas de origens tão díspares ao redor de um projeto compartilhado que é musical, visual e comunal. E aqui percebemos que esse nome não é gratuito, já que ele apresenta uma metáfora muito compatível com o que constroem em conjunto, como partes de algo maior, além de representar um exemplo formidável de uma das estrofes mais marcantes de uma das músicas citada no início: 

United we stand, yes divided we fall

Together we can stand tall

O próximo evento sera realizado no dia 10 de novembro trazendo como convidado o autor do mais recente lancamento do selo, o mexicano Regal86, ao lado dos residentes. Ambos são, como tudo que saiu desse cadinho de diversão sonora até aqui, imperdíveis.

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