Se você gosta de minimal: conheça a MINIM. Falamos com os seus fundadores

Por: Lucas Doné

A cena eletrônica conceitual no Brasil tem tido um avanço muito grande. Avanço não apenas em quantidade, mas também em um público que se tornou mais pesquisador, que está indo atrás de festas com identidade própria, focadas em diferentes estilos. Cansaram de salada. Com esse crescimento, festas como SUBDV, Crema, Mamba Negra, viraram referência para o surgimento de novas festas, como a MINIM.

MINIM, pra quem não conhece ainda, é uma label party recém-criada na ilha de Florianópolis, voltada ao minimal. A primeira edição rolou no final do ano passado, estreando com PI GE. Ele é uma lenda, dono de uma das maiores lojas de disco no Japão. Colecionador de vinis raros e amante da música brasileira, o japonês fez sua passagem por aqui com duas apresentações, uma em Florianópolis, na MINIM, e outra em SP no D-Edge.

A segunda edição da MINIM rola agora, dia 19 de janeiro. O núcleo investe forte novamente na curadoria e traz um dos projetos mais desejados dentro dessa linha sonora, TOFU Productions, duo formado por Thomas Melchior e Fumiya Tanaka. Junto com o outro duo STEKKE, formado pelos brasileiros Ale Reis e Renee, irão intensificar essa identidade e essa vertente dentro da ilha. Confira mais informações aqui.

Conversamos com dois dos fundadores do núcleo, ao lado do Ale Reis: Doriva Rozek e Renee. São DJs e produtores grandes influenciadores da cena nesse estilo.

 

16144924_10209949724114294_1097131869_o_500
Doriva e Renee / Foto: Mar Santos

HOUSE MAG – Olá, um prazer estar falando com vocês, principalmente sobre o projeto tão bem direcionado e que mostra um trabalho grande da parte dos dois. Bom, vamos lá. Quando vocês sentaram para colocar no papel toda a ideia do projeto e começaram a trabalhar pra executar, qual foi o motivo chave para desenvolverem ele?

Renee – Amor, desejo e sonho. Temos amor por uma musicalidade. Um desejo de vivenciar bons line ups consistentes. E sonho de possibilitar às pessoas ouvirem um som no qual acreditamos, amamos, desejamos, e que elas possam a partir disso, formatar suas próprias opiniões.

Doriva – Eu sempre quis ter uma festa assim, algo que eu pudesse imprimir as minhas próprias ideias e conceitos. Quando o Renee me ligou convidando pra fazer parte, o projeto já estava praticamente definido. Eu entrei só para somar. Floripa é uma cidade multicultural, tem muitas peculiaridades que eu não encontrei em nenhum outro lugar no Brasil. Como evento focado em um estilo de música, talvez seja a parte mais interessante, porque não tínhamos isso aqui. Buscamos sempre aplicar o que aprendemos ao longo dos anos, mesmo sendo a primeira festa que eu realmente estou diretamente envolvido, mas sempre tendo a música como foco principal, porque ela é a razão que nos faz mover para frente.

 

16196484_10209949263022767_1712269693_o_500
Foto: Mar Santos


HOUSE MAG – Como foi a experiência do primeiro evento, a aceitação do público? Querendo ou não vocês estão trabalhando um público acostumado com sol e praia. Como é trazer essa atmosfera mais obscura do minimal para a ilha?

Doriva –
O PI-GE é um DJ incrível, ele representou exatamente o que eu gostaria que fosse, música sincera feita de coração. Não quero colocar rótulos em artistas: dizer que ele é um DJ de minimal é bem raso, porque minimal é uma sub-vertente da arte como um todo e isso pode se aplicar a qualquer artista. Eu gostei muito do resultado, da entrega dos meus amigos comparecendo, comprando ingressos, isso é muito gratificante, mesmo num lugar e região onde ainda impera a cultura do VIP, infelizmente. Fazer uma atmosfera mais clubbing dentro de um bairro tipicamente natural, que é a Lagoa da Conceição, talvez seja o contraste mais interessante. A Lagoa hospeda grande parte das belezas naturais de Floripa, o Malam é um club escuro que combina com a proposta mais underground da festa, mas acho que você estando em um club desses e ao mesmo tempo sair dali e estar a alguns metros da natureza, faz ao mesmo tempo você viver a música e a cidade.

Renee – O primeiro evento foi incrível. Mas todo evento que se busca qualidade, temos que aperfeiçoar. O Set do Neto Debortoli e Doriva Rozek foram na medida para deixar a pista para o Pi-Ge, que fez um dos melhores sets que ouvi na vida. Muito maduro, com muita segurança e técnica manteve todo mundo na pista o tempo todo. Kenzo entrou em seguida com a batata quente na mão, fez um belo set, como já era de se esperar. Nos próximos eventos teremos grandes mudanças no soundsystem, lighting, entre outros detalhes.
 

 

HOUSE MAGDoriva, com quase uma década de trajetória e de pesquisa, vem criando e tocando minimal no Brasil inteiro. Renee, por sua vez, tendo influencias no dub, vem introduzindo o minimal  e micro house há alguns anos. Como vocês enxergam esse crescimento da vertente do Brasil? E como pretendem trabalhar o projeto dentro desse crescimento?

Doriva – Acho que a minha entrega sempre foi muito sincera, eu gosto muito de minimal, mas particularmente falando, às vezes são coisas distintas, eu gosto de uma coisa e o Dee Bufato, que é um DJ que nos ajuda muito e é muito talentoso também, gosta de outra, e ambas são sonoridades minimalistas. Acho que a soma dessas influências está formando o cenário que estamos vivendo hoje, colaboração entre nós DJs desse estilo também tem havido bastante, tanto em producing, quanto nos eventos, todos tem se ajudado de uma maneira ou outra. O projeto não tem limites, eu gosto e toco um som mais romanian house e o Renee e Ale um som mais Perlonized, pode se assim dizer, tanto que eles que vão abrir para o Melchior e Tanaka dia 19. Durante a nossa programação esse ano, já pensamos em vários nomes que dançam entre essas sonoridades e tem saído ideias legais também, agregando um ao outro e fazendo assim o projeto crescer.

Renee – A marca ainda é muita nova, e através dela, podemos abrir horizontes. Mas tudo no seu tempo. A princípio, vamos organizar os eventos e deixar as coisas fluírem. Iniciamos nosso canal de Podcast, quem sabe algum dia uma label, … mas são coisas que precisam de muito tempo para serem pensadas, projetadas. Por agora vamos manter o foco e energia nos eventos e buscar levar o melhor possível aos clubbers amantes dessa musicalidade.

 

15267990_200438403749647_3901095249985470214_n_500
Foto: Mar Santos


HOUSE MAG – Esse hype na vertente aqui no Brasil se deve também à crescente de tal na Europa. Para que não haja um crescimento sem qualidade, é muito importante ter DJs, núcleos e festas que estão muito bem direcionadas e intencionadas no que devem passar não só musicalmente, mas em todo contexto de festa (Soundsystem, ambiente, etc). Como vocês lidam essa necessidade dentro do projeto diante a realidade dos clubes brasileiros?

Doriva – Eu não diria hype, eu não gosto dessa palavra, isso condiz com algo fabricado, coisa que nosso som nunca foi. Ele evoluiu de forma natural e espontânea, com um passo de cada vez. Os meus ídolos não administram páginas de Facebook, contas de Soundcloud, ou qualquer outra rede social, eles não jogam isso na sua cara, você tem que achá-los sozinho. Obviamente, estamos no Brasil e não na Europa onde isso acontece automaticamente. Aqui precisamos levar informação mastigada para o público, se não ele realmente não se interessa. Perlon, Sunwaves, Arpiar, estão ficando conhecidos pelo público mais novo aqui no Brasil, mas isso não é hype, é fruto do trabalho de anos de muita gente aqui. Muitas pessoas que investiram tempo e dinheiro nesse rolê e que hoje podem colher os frutos disso.

Ser focado dentro do contexto é primordial, porque sem saber o que você quer realmente entregar, não funciona. A pista que está dançando é a cara de quem está realizando aquilo, então quanto mais fiel você for, melhor será. Isso serve tanto para a promoção das festas, quanto como você apresenta isso na forma visual, coisa que o Dee faz muito bem pra nós. É difícil, com certeza, mas se você quer algo assim direto, precisa ir atrás e fazer. Os clubs são incomparáveis, são empresas grandes, que precisam de muito mais economicamente falando, muito mais gente depende disso, do que festas independentes. Estou muito feliz com tudo o que tem acontecido, com o tanto de interesse orgânico com a MINIM e a música que estamos fazendo.

Renee – Todos os locais têm suas qualidades e seus defeitos. Sem dúvida queremos entregar tudo na melhor forma como pensamos, porém nem tudo é viável em curto espaço de tempo. Então aprimorar alguns detalhes por ordem de prioridade, é fundamental. Antigamente os clubs tinham uma linha de som mais linear, e bookers que direcionavam a parte artística.

Hoje, em função de uma diversidade musical maior, os clubs abriram as portas para mais artistas.

Essas festas não creio que surgiram por hype. Mas surgiram por uma alternativa de voltar a buscar a essência do passado, onde você ia em determinado club já sabendo que musicalidade iria encontrar, independente de conhecer o artista que iria se apresentar ou não. Portanto, os amantes do minimal iam sempre nas festas de minimal. Aliás, a maioria dos artistas que tocam “minimal”, tocam house, techno, minimal. Buscamos então, na medida do possível, trazer um som que seja a cara da marca, e trazer os clubbers amantes dessa sonoridade para a nossa pista.

 

16113146_10209941020416707_4008466624862544803_o_500_01


HOUSE MAG – Como vocês enxergam o projeto daqui 5 anos?  E o crescimento da cena, nos quesitos, festival, clubes e público.

Doriva – Sobre a cena é difícil dizer, eu sou um DJ relativamente novo em comparação aos que eu conheço e sou amigo. Eu já vi muita gente entrando, achando legal e saindo da noite um ano depois, assim como tem amigos meus que mesmo com toda dificuldade de se profissionalizar não conseguem largar. Ela é mutável e sempre é legal acompanhar seu crescimento e quem realmente fica quando ela cai, acho que ninguém tem mais dúvida que pelo menos aqui no sul, ela já é uma realidade da noite há muitos anos. Então podemos dizer que temos que acompanhar os mais novos e ouvir aqueles que já são mais velhos e estão há mais tempo.

O que eu quero da MINIM é que ela se torne um ponto de reflexão, que ela consiga espalhar a sua ideia aqui no sul do Brasil, assim como a Crema e outras festas fizeram. Não quero julgar musicalmente, acho que se alguém quiser fazer uma festa de Drum and Bass ou Techno, que seja pelas melhores intenções possíveis, porque a nossa música merece isso, ela é muito sensível a essas intenções e consegue responder de uma maneira bem genuína quando trabalhada com amor.

Renee – A brand MINIM surgiu pois acreditamos numa musicalidade, que não é popular, porém cada vez mais vem sendo apreciada. Dessa forma, pensamos em proporcionar um evento que tenha sentido, significado, uma musicalidade, identidade, que tenha “meaning”. MINIM foi a união sonora de meaning com minimal. Dentro disso, nosso designer Diego Bufato desenvolveu a logo em algumas semanas, buscou desconstruir a letra M em comum em ambas palavras. Tudo que fazemos é sempre bem pensado, discutido, estudado, e fazemos isso por todos nós, afinal o projeto é pra todos nós, eu, Ale Reis, Doriva, DJs, clubbers, …E pretendemos levar às pessoas line ups coesos, e uma musicalidade consistente.

Temos alguns planos futuros em parcerias com outras marcas e festivais, quem sabe em breve teremos mais informações concretas sobre tudo isso. Pensar muito na frente ainda é muito cedo, e será reflexo de muitas variáveis. Por enquanto buscamos agregar e formatar um público bacana pra festa, que valorize o trabalho que vem sendo feito, valorize os artistas, e que todos possam curtir boas noites, boas músicas, bons sets.


HOUSE MAG – Renee: ano passado sua gravadora Sketches fez seu primeiro release em vinyl com remix do Thomas Melchior, um dos integrantes do TOFU productions. Como é essa relação com ele e podemos ver mais parcerias daqui pra frente?

Renee – Sempre tivemos uma grande amizade com Thomas Melchior desde que nos conhecemos alguns anos atrás. Tudo entre nós tem fluido de forma natural. Certamente gostaríamos de ter algum release autoral do Thomas na nossa label, pela grande admiração que temos pelo seu trabalho. Quem sabe, algum dia. Quanto a outras parcerias, sem dúvidas. Já temos alguns releases prontos, com participações de artistas que apreciamos logo mais na label. E outros ainda estão por vir.

 

Fique por dentro